terça-feira, fevereiro 25, 2014

O homem que plantou uma floresta sozinho

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O homem que plantou uma floresta sozinho

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Numa ilha fluvial da Índia, acossada pela mudança climática, um exemplo heroico revela que é possível enfrentar desastres naturais
Por Ingrid Araújo, no Pensamento Verde
Dizem que um homem precisa fazer pelo menos uma das três coisas antes de morrer: ter um filho, escrever um livro ou plantar uma árvore. Jadav Payeng, morador de Assam, nordeste da Índia, pelo visto exagerou na terceira opção. Durante 30 anos o indiano plantou o equivalente a 540 hectares ou 800 campos de futebol oficiais, na Ilha de Majuli, no leito do rio Brahmaputra.
A ilha fluvial já sofreu erosões no solo arenoso e 70% dela já ficaram alagados devido aos impactos do aquecimento global que afetaram o rio Brahmaputra. Desde 1979 Payeng se preocupava com a precariedade da Ilha e desde então buscava soluções e apoio do governo local para evitar as enchentes e, principalmente, poupar a vida dos animais.”As cobras morreram no calor, sem qualquer cobertura arbórea. Alertei o departamento florestal e perguntei se eles poderiam plantar árvores lá”, relata o indiano.
A única solução encontrada pelas as autoridades era a de plantar bambu. Sem muito sucesso, Payeng disse que chorou debruçado sobre os animais mortos ao ver as tragédias. “Não havia ninguém para me ajudar. Ninguém estava interessado”, desabafa Payeng. O indiano não se conformou e logo procurou alguma alternativa para transformar a situação.
Jadav Molai Payeng
Payeng começou a cuidar da floresta sozinho plantando árvores e vivendo por muito tempo naquele banco de areia até a vegetação crescer e dar forma a floresta de “Molai Khatoni”. Desde os 16 anos, Payeng cuida da ilha, certa vez ele relatou a um jornal indiano que precisou trazer para a ilha algumas formigas vermelhas e outros animais que serviriam de alimento para conservar a vida da fauna local. “Depois de 12 anos, vimos urubus. As aves migratórias, também, começaram a afluir aqui. Cervos e gado atraíram predadores”, afirmou Payeng.
Para Payeng, a natureza tem uma próspera cadeia alimentar e por isso deve ser protegida pelos seres humanos. A história de Payeng é tão impactante que foi tema de um documentário sobre preservação da natureza. Veja o trailler da história contada pelo diretor Will MacMaster:

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PS MIMI
o homem que plantava árvores

segunda-feira, fevereiro 24, 2014

E se um beija-flor pousar na sua janela?

carta maior


E se um beija-flor pousar na sua janela?

Vigilância Líquida, mais recente obra traduzida do autor polonês, estuda a crescente e muita vez perigosa demanda por "segurança" e sua ameça à política.


Léa Maria Aarão Reis
ista.edu
Depois de criar a consagrada expressão modernidadelíquida para a vida contemporânea – fluida, inconstante, insegura e insatisfatória – e a mesma conceituação para a pós-modernidade, uma modernidade tardia e “perturbadora” como a que vivemos hoje; e após inscrever vários best sellers sobre o assunto(Modernidade líquida, Amor líquido, Vida líquida e Medo líquido) na sua vasta obra literária, o polonês Zygmunt Bauman, 83 anos de idade e sempre transbordando de energia, publicou no Brasil, há apenas um mês, mais um volume do que podemos chamar de série - ou de coleção.
 
Vigilância líquida (Liquid Surveillance [A Conversation]), editado no Brasil pela Zahar, é o resultado de recentes conversas de Bauman, professor emérito das universidades de Varsóvia e de Leeds, na Grã Bretanha, com o amigo David Lyon, professor da Universidade de Queens, no Canadá, que assim como ele também é sociólogo e estuda os mecanismos de controle e vigilância da sociedade, no caso a sociedade líquida, e as demandas de “segurança” crescentes – muitas delas artificiais, como as que procuram classificar como terrorismo determinadas manifestações políticas - estimuladas por empresas de tecnologia ou, com frequência, pelos interesses de ocasião de grupos e partidos políticos.
 
O objetivo do livro, segundo Bauman e Lyon, é a compreensão crítica da nossa sociedade pontilhada de câmeras de vídeo, por exemplo, que se multiplicam nos espaços públicos. É sobre a vigilância que aumenta sobre os indivíduos quando fazem suas compras mais rotineiras. O controle originado na participação nas redes sociais, no twitterfacebook (“o privado é público, é algo a ser celebrado e consumido tanto por incontáveis ‘amigos’ quanto por ‘usuários’ ocasionais”, lembram os autores) ou uma simples busca, uma pesquisa no google que resulta no monitoramento, sem o nosso conhecimento, da intimidade de cada um. Os “fragmentos de dados pessoais obtidos para um objetivo são facilmente usados para outro fim”.
 
Todo este imensurável material, arquivado em gigantescos bancos de dados de perfis,está prontos para ser usado e manipulado a qualquer momento. Em um aeroporto, durante uma inocente viagem de férias, em um check in de hotel ou numa abordagem policial. Bancos de dados que fazem dos mecanismos de controle daquele futuro pintado por Orwell um ameno refresco de laranja. Mas, ao mesmo tempo, assim como em 1984estamos todos (ou estaremos) perfilados à revelia e controlados por um poder já hoje invisível.
 
David Lyon escreve: “Somos permanentemente checados, monitorados, testados, avaliados, apreciados e julgados.” E lembra: vigilância para proteção é uma coisa; vigilância para controle, outra.
 
Os acessos online, as senhas para ingressar em prédios comerciais e mesmo residenciais (esses, já há tempos de uso comum nas grandes cidades dos países centrais), os cartões de controle em código, o login, a leitura de impressões digitais em bancos, a apresentação de documento de identidade requerida com frequência cada vez maior, enfim, a “vigilância é uma dimensão central da modernidade”, diz Bauman, concluindo sobre essa invasão (des)controlada. E a própria invasão, líquida e fluida por sua vez, e por isto mesmo despercebida pelos ingênuos e pelos distraídos, exerce controle e vigilância permanente, se infiltrando e se espalhando em todas as áreas da vida líquida e “perturbadora”, no dizer de Lyon.
 
Mas além desse tipo de modernidade que tem se “liquidificado” (como define Bauman), em novas e diferentes maneiras, e para além do mantra de Marx e Engels do “tudo que é sólido se desmancha no ar” e do ambiente perigoso do deleto, desconecto, bloqueio, os dois sociólogos trazem suas reflexões, em Vigilância líquida, para um outro aspecto do controle/vigilância invisível - o político, tão ou mais perigoso da inquietante atualidade.
 
Mídias sociais e drones; a aterrorizante vigilância pan-ótica (no caso, pós-pan-ótica) criada na arquitetura de prisões de última geração; a (in) segurança no cotidiano; o consumismo e a classificação social (ser um árabe ou um muçulmano, hoje, pode ser um problema em qualquer aeroporto ou fronteira; e, dependendo do momento da chamadaconjuntura, o mesmo ocorre para um latino-americano: um mexicano, um venezuelano, por exemplo, num aeroporto dos Estados Unidos). Estes são temas do livro publicado agora.
 
Concluindo a conversa entre Bauman e Lyon, considerações sobre Ética e Esperança. “A vigilância digital é uma espada afiada cuja eficiência ainda não sabemos como reduzir”, escreve o pensador polonês. “É uma espada com dois gumes que ainda não sabemos manejar com segurança.”
 
No aspecto político, evidentemente o 11 de setembro foi um marco fundamental para a expansão desordenada das novas tecnologias de espionagem e vigilância. No seu livro, Bauman sublinha “o aumento espetacular do número de drones reduzidos ao tamanho de uma libélula ou de um beija-flor confortavelmente empoleirado no peitoril de uma janela; ambos (drone e beija-flor) destinados, na saborosa expressão do engenheiro espacial americano Greg Parker, a ‘desaparecer em meio à paisagem’.
 
Ele relembra que mais de 1900 insurgentes nas áreas tribais do Paquistão foram mortos por drones americanos – os famosos predators – desde 2006.
 
Reduzidos agora ao tamanho de pássaros, mas preferivelmente de insetos - os designersmilitares já trabalham nesses drones mais avançados. Os movimentos de voo das mariposas, por exemplo, são mais fáceis para a tecnologia imitar do que o bater de asas dos pássaros.
 
Pergunta-se, enquanto as mariposas não entram em cena – ou melhor, na paisagem: o que você fará se, de repente, um dia, um beija-flor vier e pousar na sua janela?
 
Para Bauman, vive-se a época do divórcio entre o Poder e a Política – pelo menos na Europa onde, mesmo ainda eficiente comparado aos padrões nacionais, o sistema do bem-estar social está sendo desmantelado. “Poder e Política estão se separando (...) e a política parece irrelevante para os problemas e temores da vida das pessoas. O Estado perdeu Poder e não consegue manter e cumprir as promessas feitas há 50 anos; sem ele, oferece-se cada vez menos aos cidadãos.”
 
Para Zygmunt Bauman, a qualidade da democracia, que viveu sua época de ouro há meio século, está hoje em decadência. Uma visão eurocentrista a registrar o que se passava, na época, no velho continente europeu. O oposto do que vivemos, então, no Brasil e no continente sul-americano.
 
Na cena da realidade atual onde, segundo o sociólogo, “estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo”, Bauman repisa dois dos conceitos básicos do seu pensamento – a segurança e a liberdade. Sem a segunda a primeira é “escravidão”, em suas palavras. Mas para alcançar a segurança é preciso entregar um pouco da liberdade. Ganha-se algo por um lado, perde-se pelo outro. “E ninguém encontrou ainda a fórmula de ouro da mistura perfeita,” diz ele.
 
O que não significa que, livre, o indivíduo encontre a forma suprema da segurança na (in)segurança.
 
Otimista, e criticando os falsos gurus de hoje que ganham fortunas escrevendo livros e dando cursos sobre como encontrar a felicidade, Bauman conclui em Vigilância líquida: “A história não vai destruir nossas esperanças – desde que escutemos seu aviso.”
 
Ou que o tal beija-flor não pouse, de repente, no peitoril da nossa janela.
 
 
Em tempo: esta semana, Edward Snodewn observou a propósito da questão da vigilância de massa digital:
 
"Hoje, uma pessoa comum não pode pegar o telefone , enviar e-mail a um amigo ou encomendar um livro sem  registrarem suas atividades que estão sendo criados em arquivos e analisados por pessoas com autoridade para colocá-lo na cadeia. Eu sei: eu sentei naquela mesa. Eu digitei os nomes.

Quando sabemos que estamos sendo observados nós nos impomos restrições sobre nosso comportamento - mesmo atividades claramente inocentes - da mesma forma como se nós fossemos obrigados a fazê-lo. Os sistemas de vigilância em massa de hoje, os sistemas que preventivamente automatizam a captura indiscriminada de registros privados, constituem uma espécie de vigilância do tipo máquina do tempo - uma máquina que simplesmente não pode funcionar sem violar nossa liberdade. E isto permite que os governos examinem cada decisão que você já fez, cada amigo com quem você já falou. Mesmo um erro bem-intencionado pode transformar uma vida de cabeça para baixo.

Para preservar as nossas sociedades livres temos de nos defender não só contra inimigos distantes, mas contra as políticas domésticas." (Ou seja, nacionais/N. R.)

domingo, fevereiro 16, 2014

Países de unem contra tráfico de animais silvestres

o eco
http://www.oeco.org.br/noticias/28012-paises-de-unem-contra-trafico-de-animais-silvestres


Países de unem contra tráfico de animais silvestres
Vandré Fonseca - 14/02/14

RonocerontesMedidas podem ajudar a reduzir a morte de rinocerontes-negros da África do Sul, vítimas da caçadores que buscam os chifres do animal. Crédito: © Martin Harvey / WWF-Canon.
Líderes de 46 países se comprometeram a ‘“tomar ações decisivas e urgentes” para combater o tráfico internacional de espécies selvagens. A “Declaração de Londres” foi assinada essa semana, na capital inglesa, após dois dias de negociações a portas fechadas. Entre as medidas que as nações se comprometeram a adotar estão ações para erradicar o mercado de produtos oriundos da caça ilegal, acordos para fortalecer a aplicação das leis e promoção de alternativas sustentáveis para a sobrevivência e o engajamento das populações locais na luta contra a caça ilegal de animais selvagens.
A reunião foi acompanhada por organizações não-governamentais que lutam contra o tráfico internacional de espécies e também por instituições que podem agir ou oferecer recursos para combater esse tipo de crime. O Fundo Mundial para o Meio Ambiente (WWF) e a Traffic, rede internacional que monitora o tráfico de animais e plantas, divulgaram uma nota onde acolhem a declaração. Segundo as organizações, o documento reconhece as graves consequências econômicas, sociais e ambientais do  tráfico internacional da fauna e da flora, destacando que a caça ilegal e o tráfico estão sendo controlados por organizações criminosas que minam o estado de direito, a boa governança e encorajam a corrupção.
Para a conselheira-chefe para espécies do WWF do Reino Unido, Heather Sohl, os governos que assinaram a declaração enviaram uma forte mensagem: “Crime contra a vida selvagem é um crime sério e tem que ser interrompído. Esse tráfico assola populações de espécies, mas também tira a vida de guardas-florestais, impede o desenvolvimento econômico dos países e desestabiliza a sociedade por meio da corrupção”, afirmou. Heather Sohl acrescentou que existe uma crise que precisa de atenção global urgente. Para ela é preciso garantir apoio político para a nomeação de um representante especial das Nações Unidas para tratar do tema.
Entre os países que assinaram a declaração estão alguns dos mais impactados pela caça ilegal de elefantes, como a República Democrática do Congo, o Gabão, o Quênia e a Tanzânia. Outros países, que representam pontos de passagem do marfim que vai da África para a Ásia assinaram, como Togo, Filipinas, Malásia e, o maior mercado ilegal do marfim, a China. África do Sul, Moçambique e Vietnã, afetados pela caça dos rinocerontes, também participaram das negociações e aceitaram o acordo.
Para o diretor-executivo da Traffic, Steven Broad, a Declaração de Londres foi um claro apelo para que os países cumpram seu papel no combate “às redes organizadas criminosas que estão destruindo ícones mundiais da vida selvagem, desestabilizando nações e a segurança internacional”. Para ele, a chave para apoiar os esforços são as ações voltadas para o mercado consumidor e a cadeia de abastecimento, que podem reduzir a demanda por produtos de origem na caça ilegal. "Nosso desafio agora é manter a pressão e ajudar a traduzir esta atenção em ação organizada, para colocar compromissos corajosos da Declaração em ação”, afirmou.

quarta-feira, fevereiro 12, 2014

Berlim, possível capital mundial das hortas comunitárias

OP
http://outraspalavras.net/outrasmidias/destaque-outras-midias/berlim-possivel-capital-mundial-das-hortas-comunitarias/


Berlim, possível capital mundial das hortas comunitárias

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Elas ocupam um antigo aeroporto, telhados de bairros populares, espaços livres. Em torno do canteiros, cresce cultura de tolerância, celebrações e reapropriação da cidade
Cada vez mais, moradores trabalham a terra para cultivar tomates, batatas e… vínculos sociais, em uma cidade onde ainda parece haver espaço para tudo.
Alguns agriões esmirrados resistem bravamente às chuvas e aos fortes ventos que varrem as pistas de aterrissagem de um aeroporto fechado em outubro de 2008 e transformado em um amplo parque para os berlinenses.
Quando chega o bom tempo, pepinos, aipos e manjericão crescem à sombra dos girassóis nesse jardim comunitário.
Recentemente, uma colmeia instalada no meio dos pequenos lotes começou a produzir o primeiro mel a levar o selo do antigo aeroporto de Tempelhof.
De dia, carrinhos de mão e mangueiras são usados a todo vapor nas matas de ervas aromáticas. Ao anoitecer, amigos brindam com cerveja para celebrar o espírito coletivo e a amizade.
“Allmende Kontor” e o vizinho “Rübezahl Garten” são duas das inúmeras hortas que cresceram como grama na capital alemã. No bairro popular de Wedding, uma associação planeja instalar cultivos de cenouras e morangos no telhado de um supermercado local.
“Trata-se de cultivar hortaliças e também de participar de um projeto coletivo, de fazer coisas juntos. É um lugar onde todo mundo participa”, explica Burkhard Schaffitzel, um dos iniciadores do “Rübezahl Garten”.
“As pessoas vêm de todos os horizontes, de imigrantes turcos a estudantes, passando por aposentados”, conta Gerda Münnich, uma entusiasta da “Allmende Kontor”.
Esse é exatamente o segredo do sucesso. Sua horta já conta com cerca de 300 “arrendatários” e tem uma lista de espera de mais de 200 pessoas. Os responsáveis pelo jardim pagam 5.000 euros por ano à Prefeitura para utilizar seu pedaço de terra e fazem apelos por doações para manterem a iniciativa.
Legumes e verduras crescem em baldes e caixas de madeira, porque a Prefeitura não permite as plantações diretamente no solo no antigo aeroporto. Alguns optaram pela originalidade. Sapatos usados, mochilas, ou até uma velha cadeira de escritório: vale tudo para garantir seu espaço na horta.
Horta, um lugar de socialização
Hortas Urbanas jardim
A escolha pela jardinagem cria um estilo de vida e, ao redor dela, surgem “pequenos lugares”. O mecânico de bicicletas “Ismael” oferece seus serviços em um reboque velho e amassado, instalado no terreno, enquanto uma “praça do povo”, no centro do jardim, permite que a comunidade possa assar salsichas quando o grupo organiza festas.
“A horta não é apenas um lugar dedicado a uma atividade de auto-subsistência, mas um lugar de socialização”, explica a socióloga alemã Christa Müller, que escreveu um livro sobre o “urban gardening”. O fenômeno é internacional. Desde seu início nos bairros pobres de Nova York, já foram criadas hortas comunitárias em Paris, Montreal e outras cidades. Na capital alemã, houve um empurrão muito particular: a reunificação da cidade, após a queda do Muro no final de 1989, que dividiu Berlim por 28 anos. A mudança deixou uma grande quantidade de espaços vazios e abandonados.
“Londres e Paris estão saturadas. Aqui ainda temos lugar para plantar verduras”, comemora Schaffitzel. Para muitos, criar uma horta coletiva também é uma iniciativa cidadã. “Fazemos política no meio das alfaces”, brinca Gerda Münnich, que, depois de passar sua carreira diante das telas dos computadores, decidiu se dedicar às abóboras e aos repolhos.
“É se apropriar um pouco da cidade. É participar da decisão coletiva. Esse pequeno terreno que eu cultivo é um pedacinho da cidade que me pertence”, diz ela, com orgulho.
Para a socióloga Christa Müller, esse movimento é uma espécie de contrapeso à sociedade neoliberal. Esses novos urbanos “ficam felizes de produzir algo eles mesmos, no lugar de encher o carrinho no supermercado”, considera Burkhard Schaffitzel, do “Rübezahl Garten”.

segunda-feira, fevereiro 10, 2014

Europa: o escandaloso apoio aos bancos

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Europa: o escandaloso apoio aos bancos

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Nos quatro anos pós-crise, 1,3 trilhão doado à oligarquia financeira. Recursos são vinte vezes maiores que “ajuda” destinada a Portugal
Na Esquerda.net | Imagem de Beppe Giacobbe
Um relatório do eurodeputado belga Philippe Lamberts, dos Verdes, antecipado pela revista Visãoonline, chegou à conclusão de que a política da União Europeia de conceder aos bancos auxílios para impedir a sua falência, foi acompanhada de “ajudas implícitas” no valor de 1,3 trilhão de euros, em quatro anos. Este valor representa nada menos do que 10% de toda a riqueza produzida na Europa, ou quase 20 vezes mais que o empréstimo da troika a Portugal.
O relatório explica como os bancos se beneficiaram destas “ajudas implícitas” para obter enormes lucros, e aponta para os bancos da Alemanha, da França e do Reino Unido como os principais beneficiários.
Impedir os bancos de falir, custasse o que custasse
Para explicar a origem destes subsídios não contabilizados, o relatório lembra as ajudas dadas pela UE aos bancos depois da falência do Lehman Brothers, com o objetivo de enviar aos chamados “mercados” a mensagem de que a Europa não deixaria os bancos falirem. Foram atribuídos auxílios à banca no valor de 634 mil milhões de euros (oito vezes mais do que o valor do empréstimo da troika a Portugal), na forma de ajudas à liquidez, de empréstimos para a recapitalização e compra de ativos “tóxicos”, e ainda 492,2 mil milhões de euros em “garantias”.
Acontece que estes auxílios e garantias fizeram com que os ratings dos bancos fossem melhores que os dos próprios países, devidos a todos os auxílios e salvaguardas. Beneficiando-se disso, os bancos obtiveram dinheiro a custo mais baixo, e puderam especular à vontade com os títulos da dívida soberana dos Estados em maiores dificuldades, que pagavam juros mais altos. Isto significou um ganho extra aos bancos, o tal subsídio implícito que o eurodeputado belga contabiliza no valor de 1,3 bilião de euros. Esses ganhos foram tanto maiores quanto era menor o risco do respetivo país, o que fez com que os bancos alemães, franceses e britânicos se beneficiassem mais.
Sem esses subsídios, bancos teriam tido perdas
O relatório afirma, segundo a Visão, que “sem estes subsídios as grandes instituições bancárias na União Europeia estariam a declarar perdas substanciais.” Mas com este apoio estatal os grandes bancos europeus declararam lucros de 16,2 mil milhões em 2012. Isto é: os europeus, com os seus impostos, pagaram os auxílios aos bancos, e estes lucraram apesar – e por causa – da crise.
Fica também implícito no relatório que convem aos bancos que os Estados tenham os juros das suas dívidas públicas o mais altos possível – e os juros sobem quanto mais alta for a dificuldade de financiamento do país. Assim, os bancos, provocando dificuldades ao financiamento dos Estados, sobretudo dos mais fracos, lucram mais.

quinta-feira, fevereiro 06, 2014

Organização de defesa ambiental quer clonar árvores para reverter efeitos do aquecimento global

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http://www.forestcom.com.br/blog/organizacao-de-defesa-ambiental-quer-clonar-arvores-para-reverter-efeitos-aquecimento-global/?utm_source=Forest+Comunica%C3%A7%C3%A3o&utm_campaign=2a57385a49-Newsletter1_31_2013&utm_medium=email&utm_term=0_c96e1559ca-2a57385a49-27045305


Organização de defesa ambiental quer clonar árvores para reverter efeitos do aquecimento global

Archangel Ancient Tree Archive é uma organização sem fins lucrativos que, entre outras atividades, pretende criar um perfil genético das árvores mais resistentes do planeta e, em seguida, cloná-las. Eles querem criar um registro genético com os genes de árvores capazes de sobreviver em ambientes desfavoráveis ​​ou árvores que, apesar de terem sido derrubadas há muitos anos ainda possuem pequenos ramos que nascem no tronco.
De acordo com seu site, os objetivos são:
1. Espalhar o crescimento das árvores mais antigas do planeta antes que eles desapareçam;
2. Criar um pool genético das árvores mais antigas do mundo e poupá-las para o futuro;
3. Reflorestar o planeta para dar origem a uma série de benefícios ambientais, como a produção de oxigênio e o combate às alterações climáticas .
Atualmente, a Archangel Ancient Tree Archive está levando a cabo sua missão de plantar clones de sequoias na Alemanha, Irlanda, País de Gales, Nova Zelândia, Austrália e os EUA (Oregon e Califórnia). A gigantesca sequoia, que pode viver por milênios e passar dos 100 metros de altura, atualmente conta com apenas uma espécie sobrevivente, a sequoia sempervirens. O grupo escolheu esses locais porque eles fornecem o clima ideal para o crescimento dessas árvores, que atualmente estão sofrendo muito em seu habitat natural devido às alterações climáticas.
Quase uma miniatura: um carro próximo a um tronco de sequoia.
Via: Ecoosfera

quarta-feira, fevereiro 05, 2014

Indústria reavalia mudança climática

folha spaulo
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/newyorktimes/150591-industria-reavalia-mudanca-climatica.shtml


Indústria reavalia mudança climática
Por CORAL DAVENPORT
WASHINGTON - A Coca-Cola sempre esteve mais focada no seu resultado econômico final do que no aquecimento do planeta, mas, quando a empresa perdeu um lucrativo alvará de operação na Índia por causa de uma grave escassez de água no país, em 2004, as coisas começaram a mudar.
Após uma década de crescentes prejuízos no balanço da empresa, à medida que secas em nível mundial esgotam a água necessária para produzir o seu refrigerante, a Coca-Cola admite que a mudança climática é uma força economicamente perturbadora.
"O aumento das secas, uma variabilidade mais imprevisível e a cada dois anos inundações que, nas previsões estatísticas, tinham menos de 1% de chance de acontecer anualmente", listou Jeffrey Seabright, vice-presidente da Coca-Cola para meio ambiente e recursos hídricos, comentando problemas que estão afetando também o fornecimento de cana e beterraba açucareira da empresa, bem como cítricos para seus sucos. "Quando olhamos para nossos ingredientes mais essenciais, nós vemos esses acontecimentos como ameaças."
A Coca-Cola reflete um ponto de vista que cresce entre importantes empresários e economistas dos EUA: o aquecimento global é uma força que contribui para a contração das economias, para custos mais elevados das commodities e dos alimentos, para a quebra nas cadeias de suprimento e para o aumento do risco financeiro. Essa posição está em notável desacordo com o argumento de longa data, defendido pela indústria do carvão e outros, de que as políticas para conter as emissões de carbono são mais prejudiciais à economia do que o impacto da mudança climática.
Na estância suíça de Davos, líderes de corporações e políticos reunidos para o Fórum Econômico Mundial dedicaram um dia inteiro a painéis e debates sobre a ameaça da mudança climática.
Em Washington, o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, inseriu a mudança climática no centro da missão do banco, citando o aquecimento global como o principal fator no crescimento das taxas de pobreza do mundo e na redução do PIB das nações em desenvolvimento.
Na Europa, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, entidade representativa de 34 nações industrializadas, com sede em Paris, começou a alertar para os custos exorbitantes do aumento da poluição por carbono.
A Nike, que tem mais de 700 fábricas em 49 países, muitas no Sudeste Asiático, constata que o clima extremo está prejudicando sua cadeia de suprimento. Em 2008, inundações provocaram o fechamento temporário de quatro fábricas da Nike na Tailândia, e a empresa continua preocupada com o aumento das secas em regiões produtoras do algodão usado em suas roupas esportivas.
"Com isso, há menos algodão no mercado, o preço sobe e você tem volatilidade", diz Hannah Jones, vice-presidente da empresa para sustentabilidade e inovação. Tanto a Nike como a Coca-Cola estão reagindo internamente: a Coca usa tecnologias de conservação da água, e a Nike está usando mais material sintético, que é menos dependente do clima. As empresas também estão fazendo lobby nos governos para a adoção de políticas favoráveis ao ambiente.
Mas ideias como essas são difíceis de vender em países como China e Índia, onde a energia barata à base de carvão impulsiona a economia e ajuda a tirar milhões de pessoas da pobreza. Mesmo na Europa, as autoridades começaram a evitar os custos das políticas ambientais: a União Europeia já reduziu seus compromissos com energias renováveis e mudança climática.
Nos Estados Unidos, os ricos podem se dar ao luxo de palpitar. Thomas Steyer, bilionário de "hedge funds" (fundos de investimentos de alto risco) da Califórnia, já usou milhões da própria fortuna para apoiar candidatos favoráveis a políticas para a mudança climática. Agora, está trabalhando com Michael Bloomberg, o ex-prefeito de Nova York, e Henry Paulson Jr, ex-secretário do Tesouro no governo de George W. Bush, para encomendar um estudo econômico sobre os riscos financeiros associados à mudança climática. O estudo, intitulado "Negócio Arriscado", tem por objetivo avaliar os potenciais impactos da mudança climática por região e setor em toda a economia americana. "Esse estudo é sobre uma coisa: a economia", disse Paulson.
Robert Rubin, ex-secretário do Tesouro no governo Clinton, também é consultor do relatório "Negócio Arriscado". "Há uma porção de questões monumentais e realmente significativas que a economia global está enfrentando, mas esta supera todo o resto", disse Rubin. "Para avançar de modo significativo na comunidade econômica e na comunidade de negócios, você tem que torná-la concreta."
No semestre passado, governos de sete países -Colômbia, Etiópia, Indonésia, Coreia do Sul, Noruega, Suécia e Reino Unido- criaram a Comissão Global sobre Economia e Clima e iniciaram conjuntamente outro estudo sobre como governos e empresas podem lidar com riscos climáticos para melhor alcançar o crescimento econômico.
Esse estudo e o encomendado por Steyer, além de outros, serão publicados no segundo semestre, pouco antes do encontro das Nações Unidas sobre mudança climática.
Embora nos Estados Unidos muitos republicanos se oponham à ideia de um preço ou imposto sobre a poluição por carbono, alguns economistas conservadores a endossam, incluindo Arthur Laffer, assessor econômico graduado do presidente Ronald Reagan, N. Gregory Mankiw, economista de Harvard que foi conselheiro econômico da campanha presidencial de Mitt Romney, e Douglas Holtz-Eakin, diretor do Fórum da Ação Americana e conselheiro econômico da campanha presidencial de 2008 do senador republicano John McCain.
"Não há dúvida de que, se tivermos mudanças substanciais nas temperaturas atmosféricas, como todos os indícios sugerem, isso vai contribuir para a elevação do nível do mar", disse Holtz-Eakin. "Haverá efeitos econômicos e na agricultura -é inevitável." Ele acrescentou: "Eu ficaria chocado se as pessoas apoiassem qualquer coisa que não o imposto sobre o carbono".

Aquecimento global é inevitável e 6 bi morrerão, diz LOVELOCK

rolling stone
http://rollingstone.uol.com.br/edicao/14/aquecimento-global-e-inevitavel-e-6-bi-morrerao-diz-cientista


Aquecimento global é inevitável e 6 bi morrerão, diz cientista

James Lovelock, renomado cientista, diz que o aquecimento global é irreversível - e que mais de 6 bilhões de pessoas vão morrer neste século
James Lovelock, sempre provocador, acredita que a raça humana está em perigo real e imediato. "Será uma época sombria, mas emocionante"
Cortesia de James LovelockVeja a galeria completa
por POR JEFF GOODELL
Aos 88 anos, depois de quatro filhos e uma carreira longa e respeitada como um dos cientistas mais influentes do século 20, James Lovelock chegou a uma conclusão desconcertante: a raça humana está condenada. "Gostaria de ser mais esperançoso", ele me diz em uma manhã ensolarada enquanto caminhamos em um parque em Oslo (Noruega), onde o estudioso fará uma palestra em uma universidade. Lovelock é baixinho, invariavelmente educado, com cabelo branco e óculos redondos que lhe dão ares de coruja. Seus passos são gingados; sua mente, vívida; seus modos, tudo menos pessimistas. Aliás, a chegada dos Quatro Cavaleiros do Apocalipse - guerra, fome, pestilência e morte - parece deixá-lo animado. "Será uma época sombria", reconhece. "Mas, para quem sobreviver, desconfio que vá ser bem emocionante."
Na visão de Lovelock, até 2020, secas e outros extremos climáticos serão lugar-comum. Até 2040, o Saara vai invadir a Europa, e Berlim será tão quente quanto Bagdá. Atlanta acabará se transformando em uma selva de trepadeiras kudzu. Phoenix se tornará um lugar inabitável, assim como partes de Beijing (deserto), Miami (elevação do nível do mar) e Londres (enchentes). A falta de alimentos fará com que milhões de pessoas se dirijam para o norte, elevando as tensões políticas. "Os chineses não terão para onde ir além da Sibéria", sentencia Lovelock. "O que os russos vão achar disso? Sinto que uma guerra entre a Rússia e a China seja inevitável." Com as dificuldades de sobrevivência e as migrações em massa, virão as epidemias. Até 2100, a população da Terra encolherá dos atuais 6,6 bilhões de habitantes para cerca de 500 milhões, sendo que a maior parte dos sobreviventes habitará altas latitudes - Canadá, Islândia, Escandinávia, Bacia Ártica.
Até o final do século, segundo o cientista, o aquecimento global fará com que zonas de temperatura como a América do Norte e a Europa se aqueçam quase 8 graus Celsius - quase o dobro das previsões mais prováveis do relatório mais recente do Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática, a organização sancionada pela ONU que inclui os principais cientistas do mundo. "Nosso futuro", Lovelock escreveu, "é como o dos passageiros em um barquinho de passeio navegando tranqüilamente sobre as cataratas do Niagara, sem saber que os motores em breve sofrerão pane". E trocar as lâmpadas de casa por aquelas que economizam energia não vai nos salvar. Para Lovelock, diminuir a poluição dos gases responsáveis pelo efeito estufa não vai fazer muita diferença a esta altura, e boa parte do que é considerado desenvolvimento sustentável não passa de um truque para tirar proveito do desastre. "Verde", ele me diz, só meio de piada, "é a cor do mofo e da corrupção."
Se tais previsões saíssem da boca de qualquer outra pessoa, daria para rir delas como se fossem devaneios. Mas não é tão fácil assim descartar as idéias de Lovelock. Na posição de inventor, ele criou um aparelho que ajudou a detectar o buraco crescente na camada de ozônio e que deu início ao movimento ambientalista da década de 1970. E, na posição de cientista, apresentou a teoria revolucionária conhecida como Gaia - a idéia de que nosso planeta é um superorganismo que, de certa maneira, está "vivo". Essa visão hoje serve como base a praticamente toda a ciência climática. Lynn Margulis, bióloga pioneira na Universidade de Massachusetts (Estados Unidos), diz que ele é "uma das mentes científicas mais inovadoras e rebeldes da atualidade". Richard Branson, empresário britânico, afirma que Lovelock o inspirou a gastar bilhões de dólares para lutar contra o aquecimento global. "Jim é um cientista brilhante que já esteve certo a respeito de muitas coisas no passado", diz Branson. E completa: "Se ele se sente pessimista a respeito do futuro, é importante para a humanidade prestar atenção."
Lovelock sabe que prever o fim da civilização não é uma ciência exata. "Posso estar errado a respeito de tudo isso", ele admite. "O problema é que todos os cientistas bem intencionados que argumentam que não estamos sujeitos a nenhum perigo iminente baseiam suas previsões em modelos de computador. Eu me baseio no que realmente está acontecendo."
Quando você se aproxima da casa de Lovelock em Devon, uma área rural no sudoeste da Inglaterra, a placa no portão de metal diz, claramente: "Estação Experimental de Coombe Mill. Local de um novo hábitat. Por favor, não entre nem incomode".
Depois de percorrer algumas centenas de metros em uma alameda estreita, ao lado de um moinho antigo, fica uma casinha branca com telhado de ardósia onde Lovelock mora com a segunda mulher, Sandy, uma norte-americana, e seu filho mais novo, John, de 51 anos e que tem incapacidade leve. É um cenário digno de conto de fadas, cercado de 14 hectares de bosques, sem hortas nem jardins com planejamento paisagístico. Parcialmente escondida no bosque fica uma estátua em tamanho natural de Gaia, a deusa grega da Terra, em homenagem à qual James Lovelock batizou sua teoria inovadora.
A maior parte dos cientistas trabalha às margens do conhecimento humano, adicionando, aos poucos, nova informações para a nossa compreensão do mundo. Lovelock é um dos poucos cujas idéias fomentaram, além da revolução científica, também a espiritual. "Os futuros historiadores da ciência considerarão Lovelock como o homem que inspirou uma mudança digna de Copérnico na maneira como nos enxergamos no mundo", prevê Tim Lenton, pesquisador de clima na Universidade de East Anglia, na Inglaterra. Antes de Lovelock aparecer, a Terra era considerada pouco mais do que um pedaço de pedra aconchegante que dava voltas em torno do Sol. De acordo com a sabedoria em voga, a vida evoluiu aqui porque as condições eram adequadas: não muito quente nem muito frio, muita água. De algum modo, as bactérias se transformaram em organismos multicelulares, os peixes saíram do mar e, pouco tempo depois, surgiu Britney Spears.
Na década de 1970, Lovelock virou essa idéia de cabeça para baixo com uma simples pergunta: Por que a Terra é diferente de Marte e de Vênus, onde a atmosfera é tóxica para a vida? Em um arroubo de inspiração, ele compreendeu que nossa atmosfera não foi criada por eventos geológicos aleatórios, mas sim devido à efusão de tudo que já respirou, cresceu e apodreceu. Nosso ar "não é meramente um produto biológico", James Lovelock escreveu. "É mais provável que seja uma construção biológica: uma extensão de um sistema vivo feito para manter um ambiente específico." De acordo com a teoria de Gaia, a vida é participante ativa que ajuda a criar exatamente as condições que a sustentam. É uma bela idéia: a vida que sustenta a vida. Também estava bem em sintonia com o tom pós-hippie dos anos 70. Lovelock foi rapidamente adotado como guru espiritual, o homem que matou Deus e colocou o planeta no centro da experiência religiosa da Nova Era. O maior erro de sua carreira, aliás, não foi afirmar que o céu estava caindo, mas deixar de perceber que estava. Em 1973, depois de ser o primeiro a descobrir que os clorofluocarbonetos (CFCs), um produto químico industrial, tinham poluído a atmosfera, Lovelock declarou que a acumulação de CFCs "não apresentava perigo concebível". De fato, os CFCs não eram tóxicos para a respiração, mas estavam abrindo um buraco na camada de ozônio. Lovelock rapidamente revisou sua opinião, chamando aquilo de "uma das minhas maiores bolas fora", mas o erro pode ter lhe custado um prêmio Nobel.
No início, ele também não considerou o aquecimento global como uma ameaça urgente ao planeta. "Gaia é uma vagabunda durona", ele explica com freqüência, tomando emprestada uma frase cunhada por um colega. Mas, há alguns anos, preocupado com o derretimento acelerado do gelo no Ártico e com outras mudanças relacionadas ao clima, ele se convenceu de que o sistema de piloto automático de Gaia está seriamente desregulado, tirado dos trilhos pela poluição e pelo desmatamento. Lovelock acredita que o planeta vai recuperar seu equilíbrio sozinho, mesmo que demore milhões de anos. Mas o que realmente está em risco é a civilização. "É bem possível considerar seriamente as mudanças climáticas como uma resposta do sistema que tem como objetivo se livrar de uma espécie irritante: nós, os seres humanos", Lovelock me diz no pequeno escritório que montou em sua casa. "Ou pelo menos fazer com que diminua de tamanho."
Se você digitar "gaia" e "religion" no Google, vai obter 2,36 milhões de páginas - praticantes de wicca, viajantes espirituais, massagistas e curandeiros sexuais, todos inspirados pela visão de Lovelock a respeito do planeta. Mas se você perguntar a ele sobre cultos pagãos, ele responde com uma careta: não tem interesse na espiritualidade desmiolada nem na religião organizada, principalmente quando coloca a existência humana acima de tudo o mais. Em Oxford, certa vez ele se levantou e repreendeu Madre Teresa por pedir à platéia que cuidasse dos pobres e "deixasse que Deus tomasse conta da Terra". Como Lovelock explicou a ela, "se nós, as pessoas, não respeitarmos a Terra e não tomarmos conta dela, podemos ter certeza de que ela, no papel de Gaia, vai tomar conta de nós e, se necessário for, vai nos eliminar".
Gaia oferece uma visão cheia de esperança a respeito de como o mundo funciona. Afinal de contas, se a Terra é mais do que uma simples pedra que gira ao redor do sol, se é um superorganismo que pode evoluir, isso significa que existe certa quantidade de perdão embutida em nosso mundo - e essa é uma conclusão que vai irritar profundamente estudiosos de biologia e neodarwinistas de absolutamente todas as origens.
Para Lovelock, essa é uma idéia reconfortante. Considere a pequena propriedade que ele tem em Devon. Quando ele comprou o terreno, há 30 anos, era rodeada por campos aparados por mil anos de ovelhas pastando. E ele se empenhou em devolver a seus 14 hectares um caráter mais próximo do natural. Depois de consultar um engenheiro florestal, plantou 20 mil árvores - amieiros, carvalhos, pinheiros. Infelizmente, plantou muitas delas próximas demais, e em fileiras. Agora, as árvores estão com cerca de 12 metros de altura, mas em vez de ter ar "natural", partes do terreno dele parecem simplesmente um projeto de reflorestamento mal executado. "Meti os pés pelas mãos", Lovelock diz com um sorriso enquanto caminhamos no bosque. "Mas, com o passar dos anos, Gaia vai dar um jeito."
Até pouco tempo atrás, Lovelock achava que o aquecimento global seria como sua floresta meia-boca - algo que o planeta seria capaz de corrigir. Então, em 2004, Richard Betts, amigo de Lovelock e pesquisador no Centro Hadley para as Mudanças Climáticas - o principal instituto climático da Inglaterra -, convidou-o para dar uma passada lá e bater um papo com os cientistas. Lovelock fez reunião atrás de reunião, ouvindo os dados mais recentes a respeito do gelo derretido nos pólos, das florestas tropicais cada vez menores, do ciclo de carbono nos oceanos. "Foi apavorante", conta.
"Mostraram para nós cinco cenas separadas de respostas positivas em climas regionais - polar, glacial, floresta boreal, floresta tropical e oceanos -, mas parecia que ninguém estava trabalhando nas conseqüências relativas ao planeta como um todo." Segundo ele, o tom usado pelos cientistas para falar das mudanças que testemunharam foi igualmente de arrepiar: "Parecia que estavam discutindo algum planeta distante ou um universo-modelo, em vez do lugar em que todos nós, a humanidade, vivemos".
Quando Lovelock estava voltando para casa em seu carro naquela noite, a compreensão lhe veio. A capacidade de adaptação do sistema se perdera. O perdão fora exaurido. "O sistema todo", concluiu, "está em modo de falha." Algumas semanas depois, ele começou a trabalhar em seu livro mais pessimista, A Vingança de Gaia, publicado no Brasil em 2006. Na sua visão, as falhas nos modelos climáticos computadorizados são dolorosamente aparentes. Tome como exemplo a incerteza relativa à projeção do nível do mar: o IPCC, o painel da ONU sobre mudanças climáticas, estima que o aquecimento global vá fazer com que a temperatura média da Terra aumente até 6,4 graus Celsius até 2100. Isso fará com que geleiras em terra firme derretam e que o mar se expanda, dando lugar à elevação máxima do nível de mar de apenas pouco menos de 60 centímetros. A Groenlândia, de acordo com os modelos do IPCC, demorará mil anos para derreter.
Mas evidências do mundo real sugerem que as estimativas do IPCC são conservadoras demais. Para começo de conversa, os cientistas sabem, devido aos registros geológicos, que há 3 milhões de anos, quando as temperaturas subiram cinco graus acima dos níveis atuais, os mares subiram não 60 centímetros, mas 24 metros. Além do mais, medidas feitas por satélite recentemente indicam que o Ártico está derretendo com tanta rapidez que a região pode ficar totalmente sem gelo até 2030. "Quem elabora os modelos não tem a menor noção sobre derretimento de placas de gelo", desdenha o estudioso, sem sorrir.
Mas não é apenas o gelo que invalida os modelos climáticos. Sabe-se que é difícil prever corretamente a física das nuvens, e fatores da biosfera, como o desmatamento e o derretimento da Tundra, raramente são levados em conta. "Os modelos de computador não são bolas de cristal", argumenta Ken Caldeira, que elabora modelos climáticos na Universidade de Stanford, cuja carreira foi profundamente influenciada pelas idéias de Lovelock. "Ao observar o passado, fazemos estimativas bem informadas em relação ao futuro. Os modelos de computador são apenas uma maneira de codificar esse conhecimento acumulado em apostas automatizadas e bem informadas."
Aqui, em sua essência supersimplificada, está o cenário pessimista de Lovelock: o aumento da temperatura significa que mais gelo derreterá nos pólos, e isso significa mais água e terra. Isso, por sua vez, faz aumentar o calor (o gelo reflete o sol, a terra e a água o absorvem), fazendo com que mais gelo derreta. O nível do mar sobe. Mais calor faz com que a intensidade das chuvas aumente em alguns lugares e com que as secas se intensifiquem em outros. As florestas tropicais amazônicas e as grandes florestas boreais do norte - o cinturão de pinheiros e píceas que cobre o Alasca, o Canadá e a Sibéria - passarão por um estirão de crescimento, depois murcharão até desaparecer. O solo permanentemente congelado das latitudes do norte derrete, liberando metano, um gás que contribui para o efeito estufa e que é 20 vezes mais potente do que o CO2... e assim por diante. Em um mundo de Gaia funcional, essas respostas positivas seriam moduladas por respostas negativas, sendo que a maior de todas é a capacidade da Terra de irradiar calor para o espaço. Mas, a certa altura, o sistema de regulagem pára de funcionar e o clima dá um salto - como já aconteceu muitas vezes no passado - para uma nova situação, mais quente. Não é o fim do mundo, mas certamente é o fim do mundo como o conhecemos.
O cenário pessimista de Lovelock é desprezado por pesquisadores de clima de renome, sendo que a maior parte deles rejeita a idéia de que haja um único ponto de desequilíbrio para o planeta inteiro. "Ecossistemas individuais podem falhar ou as placas de gelo podem entrar em colapso", esclarece Caldeira, "mas o sistema mais amplo parece ser surpreendentemente adaptável." No entanto, vamos partir do princípio, por enquanto, de que Lovelock esteja certo e que de fato estejamos navegando por cima das cataratas do Niagara. Simplesmente vamos acenar antes de cair? Na visão de Lovelock, reduções modestas de emissões de gases que contribuem para o efeito estufa não vão nos ajudar - já é tarde demais para deter o aquecimento global trocando jipões a diesel por carrinhos híbridos. E a idéia de capturar a poluição de dióxido de carbono criada pelas usinas a carvão e bombear para o subsolo? "Não há como enterrar quantidade suficiente para fazer diferença." Biocombustíveis? "Uma idéia monumentalmente idiota." Renováveis? "Bacana, mas não vão nem fazer cócegas." Para Lovelock, a idéia toda do desenvolvimento sustentável é equivocada: "Deveríamos estar pensando em retirada sustentável".
A retirada, na visão dele, significa que está na hora de começar a discutir a mudança do lugar onde vivemos e de onde tiramos nossos alimentos; a fazer planos para a migração de milhões de pessoas de regiões de baixa altitude, como Bangladesh, para a Europa; a admitir que Nova Orleans já era e mudar as pessoas para cidades mais bem posicionadas para o futuro. E o mais importante de tudo é que absolutamente todo mundo "deve fazer o máximo que pode para sustentar a civilização, de modo que ela não degenere para a Idade das Trevas, com senhores guerreiros mandando em tudo, o que é um perigo real. Assim, podemos vir a perder tudo".
Até os amigos de Lovelock se retraem quando ele fala assim. "Acho que ele está deixando nossa cota de desespero no negativo", diz Chris Rapley, chefe do Museu de Ciência de Londres, que se empenhou com afinco para despertar a consciência mundial sobre o aquecimento global. Outros têm a preocupação justificada de que as opiniões de Lovelock sirvam para dispersar o momento de concentração de vontade política para impor restrições pesadas às emissões de gases poluentes que contribuem para o efeito estufa. Broecker, o paleoclimatologista de Columbia, classifica a crença de Lovelock de que reduzir a poluição é inútil como "uma bobagem perigosa".
"Eu gostaria de poder dizer que turbinas de vento e painéis solares vão nos salvar", Lovelock responde. "Mas não posso. Não existe nenhum tipo de solução possível. Hoje, há quase 7 bilhões de pessoas no planeta, isso sem falar nos animais. Se pegarmos apenas o CO2 de tudo que respira, já é 25% do total - quatro vezes mais CO2 do que todas as companhias aéreas do mundo. Então, se você quer diminuir suas emissões, é só parar de respirar. É apavorante. Simplesmente ultrapassamos todos os limites razoáveis em números. E, do ponto de vista puramente biológico, qualquer espécie que faz isso tem que entrar em colapso."
Mas isso não é sugerir, no entanto, que Lovelock acredita que deveríamos ficar tocando harpa enquanto assistimos o mundo queimar. É bem o contrário. "Precisamos tomar ações ousadas", ele insiste. "Temos uma quantidade enorme de coisas a fazer." De acordo com a visão dele, temos duas escolhas: podemos retornar a um estilo de vida mais primitivo e viver em equilíbrio com o planeta como caçadores-coletores ou podemos nos isolar em uma civilização muito sofisticada, de altíssima tecnologia. "Não há dúvida sobre que caminho eu preferiria", diz certa manhã, em sua casa, com um sorriso aberto no rosto enquanto digita em seu computador. "Realmente, é uma questão de como organizamos a sociedade - onde vamos conseguir nossa comida, nossa água. Como vamos gerar energia."
Em relação à água, a resposta é bem direta: usinas de dessalinização, que são capazes de transformar água do mar em água potável. O suprimento de alimentos é mais difícil: o calor e a seca vão acabar com a maior parte das regiões de plantações de alimentos hoje existentes. Também vão empurrar as pessoas para o norte, onde vão se aglomerar em cidades. Nessas áreas, não haverá lugar para quintais ajardinados. Como resultado, Lovelock acredita, precisaremos sintetizar comida - teremos que criar alimentos em barris com culturas de tecidos de carnes e vegetais. Isso parece muito exagerado e profundamente desagradável, mas, do ponto de vista tecnológico, não será difícil de realizar.
O fornecimento contínuo de eletricidade também será vital, segundo ele. Cinco dias depois de visitar o centro Hadley, Lovelock escreveu um artigo opinativo polêmico, intitulado: "Energia nuclear é a única solução verde". Lovelock argumentava que "devemos usar o pequeno resultado dos renováveis com sensatez", mas que "não temos tempo para fazer experimentos com essas fontes de energia visionárias; a civilização está em perigo iminente e precisa usar a energia nuclear - a fonte de energia mais segura disponível - agora ou sofrer a dor que em breve será infligida a nosso planeta tão ressentido".
Ambientalistas urraram em protesto, mas qualquer pessoa que conhecia o passado de Lovelock não se surpreendeu com sua defesa à energia nuclear. Aos 14 anos, ao ler que a energia do sol vem de uma reação nuclear, ele passou a acreditar que a energia nuclear é uma das forças fundamentais no universo. Por que não aproveitá-la? No que diz respeito aos perigos - lixo radioativo, vulnerabilidade ao terrorismo, desastres como o de Chernobyl - Lovelock diz que este é dos males o menos pior: "Mesmo que eles tenham razão a respeito dos perigos, e não têm, continua não sendo nada na comparação com as mudanças climáticas".
Como último recurso, para manter o planeta pelo menos marginalmente habitável, Lovelock acredita que os seres humanos podem ser forçados a manipular o clima terrestre com a construção de protetores solares no espaço ou instalando equipamentos para enviar enormes quantidades de CO2 para fora da atmosfera. Mas ele considera a geoengenharia em larga escala como um ato de arrogância - "Imagino que seria mais fácil um bode se transformar em um bom jardineiro do que os seres humanos passarem a ser guardiões da Terra". Na verdade, foi Lovelock que inspirou seu amigo Richard Branson a oferecer um prêmio de US$ 25 milhões para o "Virgin Earth Challenge" (Desafio Virgin da Terra), que será concedido à primeira pessoa que conseguir criar um método comercialmente viável de remover os gases responsáveis pelo efeito estufa da atmosfera. Lovelock é juiz do concurso, por isso não pode participar dele, mas ficou intrigado com o desafio. Sua mais recente idéia: suspender centenas de milhares de canos verticais de 18 metros de comprimento nos oceanos tropicais, colocar uma válvula na base de cada cano e permitir que a água das profundezas, rica em nutrientes, seja bombeada para a superfície pela ação das ondas. Os nutrientes das águas das profundezas aumentariam a proliferação das algas, que consumiriam o dióxido de carbono e ajudariam a resfriar o planeta. "É uma maneira de contrabalançar o sistema de energia natural da Terra usando ele próprio", Lovelock especula. "Acho que Gaia aprovaria."
Oslo é o tipo perfeito de cidade para Lovelock. Fica em latitudes do norte, que ficarão mais temperadas na medida em que o clima for esquentando; tem água aos montes; graças a suas reservas de petróleo e gás, é rica; e lá já há muito pensamento criativo relativo à energia, incluindo, para a satisfação de Lovelock, discussões renovadas a respeito da energia nuclear. "A questão principal a ser discutida aqui é como manejar as hordas de pessoas que chegarão à cidade", Lovelock avisa. "Nas próximas décadas, metade da população do sul da Europa vai tentar se mudar para cá."
Nós nos dirigimos para perto da água, passando pelo castelo de Akershus, uma fortaleza imponente do século 13 que funcionou como quartel-general nazista durante a ocupação da cidade na Segunda Guerra Mundial. Para Lovelock, os paralelos entre o que o mundo enfrentou naquela época e o que enfrenta hoje são bem claros. "Em certos aspectos, é como se estivéssemos de novo em 1939", ele afirma. "A ameaça é óbvia, mas não conseguimos nos dar conta do que está em jogo. Ainda estamos falando de conciliação."
Naquele tempo, como hoje, o que mais choca Lovelock é a ausência de liderança política. Apesar de respeitar as iniciativas de Al Gore para conscientizar as pessoas, não acredita que nenhum político tenha chegado perto de nos preparar para o que vem por aí. "Em muito pouco tempo, estaremos vivendo em um mundo desesperador, comenta Lovelock. Ele acredita que está mais do que na hora para uma versão "aquecimento global" do famoso discurso que Winston Churchill fez para preparar a Grã-Bretanha para a Segunda Guerra Mundial: "Não tenho nada a oferecer além de sangue, trabalho, lágrimas e suor". "As pessoas estão prontas para isso", Lovelock dispara quando passamos sob a sombra do castelo. "A população entende o que está acontecendo muito melhor do que a maior parte dos políticos."
Independentemente do que o futuro trouxer, é provável que Lovelock não esteja por aí para ver. "O meu objetivo é viver uma vida retangular: longa, forte e firme, com uma queda rápida no final", sentencia. Lovelock não apresenta sinais de estar se aproximando de seu ponto de queda. Apesar de já ter passado por 40 operações, incluindo ponte de safena, continua viajando de um lado para o outro no interior inglês em seu Honda branco, como um piloto de Fórmula 1. Ele e Sandy recentemente passaram um mês de férias na Austrália, onde visitaram a Grande Barreira de Corais. O cientista está prestes a começar a escrever mais um livro sobre Gaia. Richard Branson o convidou para o primeiro vôo do ônibus espacial Virgin Galactic, que acontecerá no fim do ano que vem - "Quero oferecer a ele a visão de Gaia do espaço", diz Branson. Lovelock está ansioso para fazer o passeio, e planeja fazer um teste em uma centrífuga até o fim deste ano para ver se seu corpo suporta as forças gravitacionais de um vôo espacial. Ele evita falar de seu legado, mas brinca com os filhos dizendo que quer ver gravado na lápide de seu túmulo: "Ele nunca teve a intenção de ser conciliador".
Em relação aos horrores que nos aguardam, Lovelock pode muito bem estar errado. Não por ter interpretado a ciência erroneamente (apesar de isso certamente ser possível), mas por ter interpretado os seres humanos erroneamente. Poucos cientistas sérios duvidam que estejamos prestes a viver uma catástrofe climática. Mas, apesar de toda a sensibilidade de Lovelock para a dinâmica sutil e para os ciclos de resposta no sistema climático, ele se mostra curiosamente alheio à dinâmica sutil e aos ciclos de resposta no sistema humano. Ele acredita que, apesar dos nossos iPhones e dos nossos ônibus espaciais, continuamos sendo animais tribais, amplamente incapazes de agir pelo bem maior ou de tomar decisões de longo prazo que garantam nosso bem-estar. "Nosso progresso moral", diz Lovelock, "não acompanhou nosso progresso tecnológico."
Mas talvez seja exatamente esse o motivo do apocalipse que está por vir. Uma das questões que fascina Lovelock é a seguinte: A vida vem evoluindo na Terra há mais de 3 bilhões de anos - e por que motivo? "Gostemos ou não, somos o cérebro e o sistema nervoso de Gaia", ele explica. "Agora, assumimos responsabilidade pelo bem-estar do planeta. Como vamos lidar com isso?"
Enquanto abrimos caminho no meio dos turistas que se dirigem para o castelo, é fácil olhar para eles e ficar triste. Mais difícil é olhar para eles e ter esperança. Mas quando digo isso a Lovelock, ele argumenta que a raça humana passou por muitos gargalos antes - e que talvez sejamos melhores por causa disso. Então ele me conta a história de um acidente de avião, anos atrás, no aeroporto de Manchester. "Um tanque de combustível pegou fogo durante a decolagem", recorda. "Havia tempo de sobra para todo mundo sair, mas alguns passageiros simplesmente ficaram paralisados, sentados nas poltronas, como tinham lhes dito para fazer, e as pessoas que escaparam tiveram que passar por cima deles para sair. Era perfeitamente óbvio o que era necessário fazer para sair, mas eles não se mexiam. Morreram carbonizados ou asfixiados pela fumaça. E muita gente, fico triste em dizer, é assim. E é isso que vai acontecer desta vez, só que em escala muito maior."
Lovelock olha para mim com olhos azuis muito firmes. "Algumas pessoas vão ficar sentadas na poltrona sem fazer nada, paralisadas de pânico. Outras vão se mexer. Vão ver o que está prestes a acontecer, e vão tomar uma atitude, e vão sobreviver. São elas que vão levar a civilização em frente."
(Tradução de Ana Ban)